Alguém deve explicar para o Dr. Deltan Dallagnol a diferença entre o exercício do ministério público religioso e do Ministério Público, criado pela Constituição de 1988.
Um, o ministério público religioso, permite o exercício da fé, com discursos inflamados, exortações, rituais, exorcismos e espetáculos musicais; permite público, clama por plateia. Outro, o Ministério Público Federal, tem suas atribuições claramente definidas na Constituição Federal e nas leis infraconstitucionais e exige, como princípio básico, respeito aos direitos constitucionais de todo e qualquer cidadão, por mais “endemoniado” que lhe pareça.
Misturar fé e religião com o exercício de uma função pública tão importante quanto a função de servidor público federal é certeza de confusão. Se este agente é um membro do Ministério Público Federal regiamente pago para defender os interesses da sociedade, esta mistura pode tornar-se explosiva.
Aumentar esta confusão com pitadas de política e execração pública ofende os direitos constitucionais dos acusados e configura desvio funcional grave.
Não é, como alguns afirmam, somente pela falta de provas. Mesmo que existissem provas cabais de cometimento de algum crime, ninguém pode ser execrado em praça pública e ter sua honra arrastada pelas ruas.
O povo, irado, escracha – e às vezes, faz até pior, os seus algozes e inimigos. O Ministério Público e nenhum poder da República pode “escrachar” cidadãos cujos direitos estes órgãos têm o dever funcional de proteger.
Se o Ministério Público presta-se a “escrachar” o cidadão, vamos ter, os cidadãos, que fechar este Ministério Público e criar outro órgão que nos proteja?
Ninguém é infalível, por mais ungido que seja pelo Deus de sua fé e por mais meritória que pareça ser a sua cruzada.
O exercício de função pública tão nobre exige nobreza de caráter, preparo e inteligência emocional. Faltam, a alguns dos procuradores da força-tarefa, entre outros atributos, inteligência emocional e preparo. E, ao que parece, faltam também supervisão e, o sempre saudável, contraditório. Falta o contraponto, a dúvida, o questionamento que permite evitar erros.
O princípio da presunção de inocência requer, de qualquer servidor público, atitude responsável e zelo. Se este servidor público é membro do Ministério Público Federal, esta responsabilidade e zelo devem ser dobrados.
Ora, eles sabem disso, pois consta de seus juramentos como advogados e dos estatutos que devem respeitar como servidores públicos e membros do MPF! Se estão a meter os pés pelas mãos como está evidente é porque, em sua cega fé messiânica, perderam o senso.
Este papel ridículo denigre a imagem do Ministério Público Brasileiro e, em dobradinha com Dr. Sérgio Moro, coloca em dúvida a lisura e a imparcialidade de todo o sistema jurídico nacional.
O que mais assusta é a omissão ou, o que seria ainda pior, o aval do Procurador-Geral da República. O senhor PGR não tem nem o falso álibi da unção, privilégio do chefe da força-tarefa.
O Dr. Janot não pode fingir que não viu. Tem que vir a público e declarar se autorizou previamente a manifestação político/messiânica ou se, para falar em linguagem apropriada ao atual momento político nacional, “levou um trança-pé, uma rasteira”.
Não acredito que o PGR, sóbrio, tenha aplicado um “auto-trança-pé”.
Custo a crer que um gigante institucional como o Ministério Público Brasileiro ficará estatelado no chão por muito tempo. Precisa reagir, antes de ser, também, “escrachado”.
Republicou isso em diálogos essenciais.
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