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Assisti a leitura pelo ministro Celso de Mello do seu voto contra este estupro da Constituição. Foi um voto cuidadoso, detalhado, fundamentado, que empatou em 5 X 5 a votação. Coube à ministra Carmen Lúcia, atual presidente, o voto de desempate, favorável à prisão do réu antes que o processo criminal tenha sido concluído, ou seja, transitado em julgado.
A qualidade do voto da presidente foi, em minha opinião, nenhuma. Não dá é possível nem dar nota, pois ela, basicamente, não votou.
Iniciou tentando justificar porque iria votar contra a Constituição, preocupada em passar para a história como uma das culpadas pelo assassinato da presunção de inocência. Depois do brilhante e bem fundamentado voto do ministro Celso de Mello a favor da Constituição e contra a permissão de prisão antes da condenação definitiva, eu também ficaria envergonhado com um voto contra a Constituição e contra o princípio da presunção de inocência.
Basicamente, a ministra Carmen Lúcia fez referência a seus votos anteriores de fevereiro e maio deste ano e a uma tal de presunção de inocência que vai se reduzindo à medida que o processo caminha e vai passando da primeira para a segunda instância, até ser julgado definitivamente. Seria, estou presumindo, uma tal de presunção de inocência fatiada.
O que ocorre, vamos ser claros, é a continuidade do esquartejamento do regime democrático e da Constituição de 88, escrita pelos constituintes eleitos pelo povo brasileiro quando o clima no país era outro. A Constituição de 88 reflete o desejo, ou melhor, a ânsia por democracia após 21 anos de ditadura. O que o Supremo decide, ao fatiar o princípio da presunção de inocência, é conspurcar a Constituição de 88, da mesma forma que o Judiciário e o Legislativo a conspurcaram durante todo o período do regime ditatorial. Basta ver as decisões daquele negro período da nossa história e comparar com a decisão de hoje. Apesar da composição do Supremo ser diferente, a coerência está mantida: votam com os poderosos. Louvo as honrosas exceções, especialmente o brilhante voto do ministro Celso de Mello.
Leia a notícia do site justificando.com:
Paulo Martins
Quarta-feira, 5 de outubro de 2016
Supremo elimina presunção de inocência em decisão que vale para todo país
Em julgamento realizado hoje, 5, o Supremo Tribunal Federal confirmou o pressentimento da comunidade jurídica e manteve o entendimento de fevereiro deste ano, quando a Corte eliminou a presunção de inocência e permitiu cumprimento da pena a partir de decisões da segunda instância. Diferentemente da primeira decisão, que foi proferida em um caso singular, desta vez, na Ação Declaratória de Constitucionalidade 43 proposta pelo Partido Ecológico Nacional, a decisão tem efeito geral.
O julgamento havia começado no primeiro dia de setembro, com sustentações orais de entidades de classe e organizações de direitos humanos, as quais fundamentaram que a Constituição era clara em desautorizar a decisão da corte, além do que o julgado contribuía para a confusão de entendimento nos tribunais e no hiper encarceramento. Naquela ocasião, o relator do caso, ministro Marco Aurélio, já havia acolhido os argumentos e decidido pela execução da pena apenas após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.
Entretanto, a esperada posição da maioria da corte prevaleceu no dia de hoje, em divergência puxada pelo ministro Edson Fachin, o qual entendeu que o artigo do Código de Processo Penal e o entendimento do Supremo, apesar de claramente opostos, não eram incompatíveis.
Outros ministros seguiram a divergência por argumentos práticos e não constitucionais, como o caso do ministro Barroso, o qual criticou a estratégia de advogados para protelar a prisão –“É mais puxado para o ridículo do que para o ruim”. Já Gilmar Mendes ironizou a preocupação de advogados com a presunção de inocência, “a resposta, nem precisa dizer, é Lava Jato”. Para ele, os presídios vão melhorar, já que vão receber “visitas ilustres” de Curitiba.
Já o ministro Luiz Fux, chegou a afirmar que existe “um direito fundamental da sociedade em ver a aplicação da lei penal” e, por isso, seria necessário interpretar contra a literalidade da Constituição.
O julgamento quase surpreendeu pela virada de voto de Dias Tóffoli, que mudou o entendimento adotado em fevereiro, mas com a confirmação dos demais, o placar final terminou em 6 x 5, pela eliminação do presunção de inocência prevista na Constituição e no Código de Processo Penal.
Apesar do entendimento do Supremo, a Constituição prevê no Art. 5º LVII que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.
Juristas comentam sobre decisão
A grande maioria dos órgãos de direitos humanos é contra tal decisão. Para o promotor de justiça do Ministério Público de Goiás, Haroldo Caetano, “trocando em miúdos, o Tribunal que outrora foi o guardião da Constituição, fará valer aquela máxima policial: ‘é inocente mas vai preso assim mesmo’.“
Já Elmir Duclerc, promotor de justiça e professor na UFBA, demonstrou sua indignação – “A qualidade técnica de alguns votos dos Srs. Ministros sobre a presunção de inocência é simplesmente pavorosa. Lembrou-me a ‘Escolinha do Professor Raimundo’, com o perdão dos humoristas. Se tivessem juízo não deixavam transmitir esse vexame“, escreveu.
O Justificando, em fevereiro, gravou um vídeo sobre o tema, externando sua posição:
Observação de dialogosessenciais.com:
não incluímos o vídeo apresentado no texto original. Entendemos que os textos apresentados são suficientes para informar aos nossos leitores.