O BRASIL NUNCA FOI UM PAÍS COMUNISTA, por Ulysses Ferraz
É urgente explicar para a população de um modo geral, inclusive aos segmentos mais escolarizados, o que significa o termo comunismo. Um conceito quando é usado de forma imprecisa e incorreta, generalizadamente, torna-se vazio de conteúdo. Só contribui para a propagação de ruídos e mal entendidos. E fomenta a violência. Até o cardeal dom Odilo Pedro Scherer foi agredido em 2016 por uma senhora que o acusou de “comunista”.
Essa onda de ódio, turbinada pela ignorância fundamentalista de certos grupos, sob a conivência dos principais meios de comunicação, vai acabar resultando em tragédias sob o pretexto de combate ao “comunismo”. Será preciso que haja mortes? Assassinatos? O Brasil nunca foi um país comunista. Tampouco socialista. É um Estado democrático de direito, com uma economia de mercado em crescimento moderado. Pelo menos éramos até 2015. Temos eleições livres e diretas regulares para os poderes Executivo e Legislativo. Pelo menos tínhamos até 2014. E se vivemos hoje em recessão, num Estado de exceção, isso não se deve a ”comunismos” mas a fascismos disfarçados de liberalismos.
O fato é que não há e nunca houve comunismo no Brasil. Nem idealizado nem real. Se houvesse, a maior parte dos meios de produção seriam de propriedade coletiva ou do Estado. Mas no Brasil, o setor privado corresponde a mais de 90% da atividade econômica do país. O “tamanho” do Estado é relativamente pequeno em proporção às maiores economias do mundo e às economias de países em desenvolvimento. A carga tributária em relação ao PIB está na média do Brics e dos países da OCDE. O grau de regulação dos mercados no Brasil é compatível com todas as democracia desenvolvidas do mundo, para que o capital não se concentre excessivamente, e não haja formação de monopólios e oligopólios. E as concentrações excessivas que existem em alguns setores, a despeito das regulamentações legais, são mais ou menos semelhantes às que ocorrem no resto do mundo capitalista. O Google e o Facebook são exemplos óbvios de que transgressões às leis concorrenciais não são exclusividade das organizações Globo. No Brasil também não há restrições draconianas para investimentos estrangeiros e a remessa de lucros para o exterior, além de permitida, não é sequer tributada. E a propriedade privada é garantida pela Constituição Federal com estatuto de direito fundamental. Um governo que implementa um mínimo de políticas públicas voltadas para inclusão social, redução da pobreza e melhor distribuição de renda e riqueza não é comunista ou socialista. Todos os países capitalistas desenvolvidos, as chamadas economias do Norte, possuem, em algum grau, maior ou menor, algum tipo de rede de proteção social. E algum mecanismo de redistribuição de renda. No Brasil, sequer atingimos o patamar de Estado de bem-estar social, como o atingido na maioria dos países ricos da Europa, apesar dos esforços desses 12 anos dos governos Lula e Dilma. A construção de uma sociedade mais justa e igualitária, sob princípios democráticos, em um Estado de direito consolidado, ainda é um objetivo quase utópico no Brasil. E cada vez que nos aproximamos deste ideal, as forças conservadoras entram em ação para desconstruir as conquistas democráticas e sociais do país, sob o pretexto de uma ameaça ”comunista”, como se vivêssemos anacronicamente nos tempos da Guerra Fria. Essas mesmas forças conservadoras que, quando lhes convêm, não respeitam os direitos humanos mais básicos, alimentam o ódio e a ignorância das massas, inclusive da classe média hipnotizada ideologicamente, e fazem crer, assim como o fizeram em 1964, que vivíamos entre 2003 e 2015 numa ditadura comunista de tipo stalinista. Até quando vamos permitir e tolerar que manipulem nossas cérebros e insultem a inteligência coletiva da nação? Basta de MBL e afins!