DAMARES NUNCA COMPREENDERÁ
No dia 29 de julho de 2016, publiquei aqui no Facebook este texto que foge à capacidade de compreensão da ministra Damares…
Por Luís Carlos Oliveira e Silva
GÊNESIS, CRIACIONISMO E TEORIA DA EVOLUÇÃO
- Os discursos da teoria da evolução e do Gênesis, acerca da “origem do homem”, não são discursos concorrentes, já que não são discursos de mesmo gênero.
- Portanto não faz sentido opor um ao outro. Quem o faz são os criacionistas, que fazem uma leitura muito particular do texto bíblico.
- É importante distinguir o relato do Gênesis da sua leitura “criacionista”. O Gênesis e o criacionismo não são a mesma coisa.
- O Gênesis é um relato mítico da origem do homem e da mulher. O Criacionismo é um movimento político-religioso baseado numa leitura ideológica que nega o caráter mítico, isto é, simbólico, do relato do Gênesis.
- O criacionismo faz uma leitura literal do texto bíblico. Eles leem o Gênesis com um interesse político-religioso, de caráter “fundamentalista”, como se este descrevesse fatos histórico-naturais, o que é uma enormidade.
- Maliciosamente, o criacionismo quer opor o Gênesis à teoria da evolução. A teoria darwinista e o relato bíblico da Criação referem-se ambos à origem do homem e da mulher, mas não têm o mesmo objeto. Não falam de uma mesma coisa. Não são discursos de mesmo gênero.
- A teoria da evolução fala do processo de transformações que resultou no surgimento do homem e da mulher. Fala de processos naturais, portanto.
- O Gênesis quer atribuir um sentido ao processo de transformações que resultou no surgimento do homem e da mulher. Não fala de processos naturais, portanto.
- Um fala de fatos histórico-naturais, sem falar de sentido da vida, por isto ser estranho à ciência. O outro fala de sentido da vida, e por isto fala de fatos simbólicos, sem referência, em geral, a fatos de história natural.
- Quem acha que os dois discursos estão falando da mesma coisa, e por isto seriam concorrentes, está mal informado, ou é mal intencionado.
- O debate entre darwinistas e criacionistas é, em geral, uma impossibilidade, um diálogo de surdos.
- A teoria da evolução fala do surgimento do homem e da mulher do ponto de vista dos fatos da história natural, com o interesse de mostrar a cadeia de acontecimentos, e sua lógica interna, imanente à natureza.
- O relato mitológico da Criação fala do surgimento do homem e da mulher com o interesse de mostrar o sentido da vida humana.
- À ciência não interessa o “sentido da vida humana”, e sim as “leis da natureza”. Ao mito as “leis da natureza” só interessam na medida que revelem o “sentido da vida humana”.
- Ciência e mito são discursos distintos, de gêneros distintos, com intenções distintas. O criacionismo luta, histericamente, para os “igualar”.
- Faz isto com um claro interesse político-religioso: fazer retroceder a marcha da história à pré-modernidade, quando toda produção espiritual humana (filosofia, ciência, arte etc.) tinha que estar subordinado aos chefes religiosos.
- A modernidade emancipou a produção espiritual humana dos chefes religiosos, o que foi uma conquista extraordinária.
- Max Weber chamou este processo de modernização de “autonomia das esferas de valor”, onde a política, a arte, a ciência libertam-se da tutela da religião.
- A perda de centralidade da religião no Ocidente abriu-lhe a possibilidade de a fazer se reencontrar com a sua dimensão ética, existencial, perdida ao longo da história, ao se confundir com moral e política.
- O criacionismo é, a um só tempo, historicamente regressista e religiosamente deletério. Ao impor, com um interesse policamente reacionário, ao texto bíblico a sua leitura literal, a extraordinária riqueza simbólica que ali reside se perde melancolicamente.
- O criacionismo faz má política e má religião. Má política por reacionarismo regressista. Má religião por querer condená-la a seguir reduzida à moral, negando-se a reconhecer na modernidade a chance de redenção da própria religião.