Compartilho artigo de autoria do economista Antonio Correa de Lacerda, publicado no blog de Leonardo Trevisan, em http://www.leonardotrevisan.com.br.
Paulo Martins
Na recente sabatina realizada no Senado Federal que aprovou a indicação de Ilan Goldfajn para a presidência do Banco Central (BC), houve ênfase na recuperação do tripé macroeconômico: metas de inflação, responsabilidade fiscal e câmbio flutuante. Não há dúvida de que o mandato em questão, de presidente do Banco Central, se refere à defesa da moeda e o discurso não surpreende, também levando em conta a formação e a atuação profissional do indicado.
No entanto, vale destacar alguns aspectos relevantes, especialmente no que se refere à política cambial. É sabido que a utilização da política cambial como instrumento de controle de inflação de curto prazo foi um recurso recorrente em praticamente todos os governos dos últimos 30 anos, para focarmos em um período mais recente da nossa história.
No governo Sarney (1985-1989) foi um dos elementos da implantação do Plano Cruzado; nos governos Itamar Franco/Fernando Henrique Cardoso foi adotado explicitamente como “âncora”, na primeira fase do Plano Real (1994-1998); durante o governo Lula (2002-2010), embora já vigesse o Regime de Metas de Inflação, que fora adotado em 1999, a valorização artificial da moeda foi elemento fundamental para o controle da inflação. Já o governo Dilma Rousseff (2011-…), depois de ter herdado um real valorizado, fez uma tentativa de desvalorização em meados do seu primeiro mandato, no final deste, assim como no início do segundo mandato visando a estimular a indústria e as exportações.
O apelo à valorização artificial da moeda é grande no Brasil. A renda da exportação de commodities, associada à pratica de juros reais elevados, proporciona um terreno fértil para isso. Os resultados de curto prazo são inegáveis, com o barateamento das importações, das viagens e das compras no exterior. O problema é que esse ganho de curto prazo se esvai no médio e no longo prazos, trazendo consequências danosas para a indústria, que perde tecido, desestimula as exportações de manufaturados e o emprego nesses setores, assim como deteriora as contas externas.
Portanto, um retorno à pratica da valorização do real é inoportuno. A desvalorização, observada ao longo de 2015 e início de 2016, restabeleceu as condições de competitividade, o que, aliadas a outros ajustes macroeconômicos e práticas inteligentes de políticas de competitividade (políticas industrial, comercial e de inovação), permitiria viabilizar a reindustrialização, com todos os benefícios do processo: crescimento sustentado, geração de empregos, de renda e de receita tributária, além de equilíbrio intertemporal das contas externas.
Ajustes. Mas tudo isso não é automático nem tampouco de curto prazo. É preciso persistir nos ajustes, lembrando que uma taxa de câmbio de equilíbrio industrial é uma condição sine qua non, porém não única.
Ressalte-se, adicionalmente, que o cenário internacional de hoje é bastante diferente do observado na primeira década dos anos 2000, em que o Brasil se aproveitou de um crescimento expressivo da China e do aumento dos preços.
A economia brasileira segue apresentando indicadores negativos, no que se refere ao nível de atividades e de investimentos. O ambiente político do País, ainda longe de uma estabilização, permanece como fator de incerteza.
As primeiras medidas do governo provisório de Michel Temer anunciadas apontam para uma guinada em vários aspectos, especialmente quanto ao papel do Estado, dos bancos públicos e dos programas sociais. Embora essas medidas pró-mercado encontrem receptividade em alguns setores, especialmente no mercado financeiro, elas não garantem um ambiente favorável ao investimento na produção e na infraestrutura. Para isso também contribuem não apenas aspectos regulatórios e de ambiente de negócios, ainda claramente desfavoráveis para as decisões, mas também a prática de uma taxa de juros muito acima da média internacional e da rentabilidade esperada nessas atividades.