Compartilho post de Rosa Freire d’Aguiar publicado no Facebook.
Ainda sobre o Macron e o florilégio de etiquetas que andam colando nele — direita, centro, esquerda, socialdemocrata light, social-liberal, neoliberal, globalista –, vale dar uma olhada em certas promessas de campanha. O cardápio é tão variado como as etiquetas:
(1) Seguro-desemprego: hoje é financiado pelas contribuições de empregados e patrões. Macron quer um sistema “universal”. Terão direito não só demitidos, mas os que pedem demissão, os autônomos (reivindicação antiga dos “intermitentes do espetáculo”), os profissionais liberais. O financiamento virá sobretudo do aumento da Contribuição Social Generalizada (CSG), imposto que incide basicamente sobre patrimônio e investimentos. Diz EM: “meu novo sistema cria uma rede de segurança para todos mas com exigências maiores”, e “controle drástico”. A esquerda acha que isso pode degenerar nas maluquices do sistema inglês tão óbvias no filme “Daniel Blake”.
(2) fisco: duas medidas, uma no cravo uma na ferradura. Para a classe média: corte de 80% na taxa de habitação (correspondente ao IPTU), paga por proprietários e inquilinos. A ideia é liberar dinheiro para aumentar o poder de compra. O Estado compensaria os 10 bi de euros que as prefeituras perderiam. E para os mais ricos: o ISF (imposto sobre fortuna) só incidirá sobre os bens imobiliários, e não sobre os investimentos financeiros (como hoje), pois estes “financiam a economia real”. A esquerda acha que é uma medida de direita, pois em geral são os mais ricos que possuem ao mesmo tempo bens imóveis e móveis.
(3) reembolso de despesas médicas: EM promete que nenhum “tratamento útil” deixará de ser reembolsado pelo Estado. E se compromete a pagar integralmente — o que está muito longe de ser o caso —, até o fim do mandato, despesas com dentista, aparelhos de audição e óculos. Aposta na baixa de preços estimulada por mais transparência e concorrência. Outra boa ideia: o “serviço sanitário de três meses”, pelo qual todos os estudantes nas áreas médicas terão de passar 3 meses em redes de ensino, empresas, e sobretudo em bairros mais pobres e na zona rural, fazendo prevenção de saúde. Uma terceira medida: instituir o hábito de remédios vendidos por unidade: “Um imperativo sanitário, uma necessidade econômica e uma evidência ambiental”.
(4) direitos trabalhistas: EM diz que manterá a semana de 35 horas, mas é a favor de acordos empresa-trabalhadores que “modulem” (leia-se aumentem…) essa carga semanal. Propõe que tb haja mudanças em função da idade. Quanto à flexibilidade, já abriu o jogo, e diz que fará mudanças por ordonnance (algo equivalente ao nosso decreto-lei): “precisamos de mais flexibilidade, não tenho medo da palavra, adaptar nosso direito trabalhista às mutações atuais”. Greves à vista…
(5) educação: a promessa é fazer mais para quem tem menos: limitar a doze alunos as turmas de alfabetização e primeiro ano nas zonas prioritárias (subúrbios pobres, quase-favelas, bairros de imigrantes). Isso exigirá mais 12 mil professores primários, que deverão ser financiados com economias drásticas na organização do “bac” (um meio termo entre o ENEM e o vestibular). Seguindo a lógica da cobrança, EM diz que quer professores mais bem pagos mas avaliados com mais rigor e frequência. As avaliações poderão ser publicadas — o que com certeza vai provocar uma grita dos sindicatos da educação, tradicionalmente muito fortes. Também quer restabelecer estudos dirigidos depois da aula, para todos os alunos.
(6) na ecologia, EM está na vanguarda e se inscreve na linha da COP21. Mantém o objetivo de reduzir o nuclear a 50 por cento do mix energético, até 2050. Quer dobrar a capacidade da eólica e da solar fotovoltaica, fechar as termoelétricas a carvão, e nem pensar em exploração ou experiência com gás de xisto. Para diminuir o efeito estufa, EM promete aumentar o custo do carbono com uma uma taxa-carbono e acabar com os subsídios ao diesel. Tb propõe que toda a alimentação coletiva (cantinas de escolas, empresas etc) tenha, até o fim do seu mandato, ao menos 50% de orgânicos.
(7) na segurança, ressuscita medidas que nos últimos anos foram iniciadas e/ou abandonadas: criação de + 10 mil postos de policiais, volta da polícia de proximidade. Medida nova: dar à polícia o poder de multar na mesma hora pequenos delitos como detenção de maconha, ou furtos em supermercado. Ele acha que o pagamento de multa alta é sanção “mais eficaz” do que uma “resposta penal tardia”. Tb prevê a construção de 15 mil vagas em prisões.
PS – o quadro é de Monet, pintado em 1878, durante uma festa que pretendia comemorar a recuperação da França depois da derrota da guerra franco-prussiana de 1870.