Fim de recessão ou ilusão estatística?, por Esther Dweck

Compartilho artigo publicado no site brasildebate.com.br.

Existem sérias dúvidas na comunidade acadêmica e nos “think tankers” sobre o propalado crescimento da atividade econômica no Brasil no primeiro trimestre de 2017, alardeada pela mídia cúmplice-hegemônica acriticamente.

A autora faz uma pergunta e tenta respondê-la. Minha expectativa é que o debate seja aprofundado e que, tanto o Banco Central quanto o IBGE, tratem o assunto com a necessária transparência, divulgando os dados e as metodologias que deram origem ao resultado alardeado. Eu gostaria de ver o IBGE e o Banco Central desmentindo que o resultado seja apenas uma ilusão estatística. Já criticamos muito o INDEC e o Ministério da Economia da Argentina por manipulação dos dados da sua economia, como vamos, agora, copiá-los? É impensável e inaceitável que os quadros técnicos do IBGE e do Banco Central aceitem participar de um aparente episódio de pós-verdade. Ou seria pré-mentira?

Paulo Martins

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Esther Dweck

Fim da recessão ou ilusão estatística?

O governo comemorou ontem (15/5) o que seria o primeiro sinal de recuperação da atividade econômica após oito trimestres de quedas sucessivas do Indicador de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br). Mas o que explica o aumento em tal índice, quando todos os demais indicadores, especialmente o emprego, apontam para um movimento contrário?

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Esse resultado foi muito influenciado por uma mudança importante em duas das séries que compõem esse indicador e que têm um peso muito elevado.

Quando olhamos a série mensal do IBC-Br, observa-se que o aumento no último trimestre foi decorrente de um aumento apenas no mês de fevereiro, sendo que já em março é possível verificar uma queda no mesmo indicador.

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A principal explicação para esse resultado do mês de fevereiro foi a mudança metodológica nas Pesquisas Mensais de Comércio e Serviços do IBGE, cuja alteração afetou o nível dessas séries de forma significativa, conforme pode ser visto no gráfico abaixo.

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A série antiga, que foi divulgada até jan/2017, apresentava uma clara trajetória de queda. Em abril de 2017, a série foi revisada e um novo valor para janeiro foi divulgado, em um nível consideravelmente acima do que havia sido divulgado anteriormente. Como pode ser visto no gráfico, houve um evidente deslocamento para cima da série, que nos meses seguintes voltou a apresentar sucessivas quedas, tanto em fevereiro quanto em março, em relação ao mês imediatamente anterior.

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Por parte do IBGE, não houve qualquer mudança nos dados de dez/2016 para trás e, dessa forma, o crescimento do mês de janeiro, em relação a dezembro, foi consideravelmente elevado e acima de qualquer outro crescimento apresentado ao longo de toda a série histórica.

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O grande problema é que, em fevereiro, o IBC-Br foi calculado já utilizando a nova série, o que claramente deslocou o nível da série do IBC-Br sem que efetivamente se verificasse uma mudança na sua trajetória. Com isso, o resultado do índice de fevereiro foi muito alto e a soma dos três primeiros meses mostrou-se acima do trimestre anterior.

Portanto, esse aumento do índice em fevereiro não decorre de qualquer mudança efetiva da economia, mas de um deslocamento das séries que compõem o IBC-Br, sem representar qualquer alteração na trajetória das séries. Como nos meses seguintes essas mesmas séries voltaram a cair, o indicador de março já refletiu tal movimento.

Em relação ao PIB, que será divulgado em 1/06/2017, o efeito dessa mudança das séries da PMC e PMS deve ser menor, pois há no cálculo do PIB mais controles, o que evita que tais variáveis determinem sozinhas a trajetória do mesmo. Ainda assim, haverá algum efeito que não deve ser visto como uma efetiva saída da recessão, sob o risco de ficarmos iludidos com um resultado que é meramente um efeito estatístico.

Crédito da foto da página inicial: Agência Brasil/Portal Brasil
16 de maio de 2017

Esther Dweck
Professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e assessora econômica do Senado Federal.

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