14/10/2018 12h10
Em dezembro de 1980, um assassinato em Nova York chocou o mundo: um fã enlouquecido, com um revólver comprado facilmente, matou John Lennon com três tiros, na porta da sua casa.
Eu estava morando lá. Ví tristeza e a comoção, em toda a parte, no mundo todo. As pessoas choravam pelas ruas. Observei, com pesar, os sinais de fraqueza dos pacifistas frente ao poderoso lobby dos produtores, distribuidores e proprietários de armas.
Como um insano pôde comprar uma arma para assassinar uma pessoa? Ora, facilmente. Consideram normal. Armas são fabricadas exatamente para isso. Para matar pessoas, eles raciocinam assim.
Três meses depois, outro crime com repercussão global: a tentativa de assassinato de Ronald Reagan, em 30 de março de 1981, 69 dias após Reagan ter assumido a Presidência da República nos Estados Unidos.
O presidente Reagan e mais três pessoas foram baleados por John Hinckley Jr. O criminoso disparou seis tiros. Em seu julgamento, Hinckley Jr. foi declarado inocente por insanidade mental e permaneceu internado em uma instituição psiquiátrica até 09 de setembro de 2016, quando foi liberado para viver com sua mãe em tempo integral, com tratamento psiquiátrico obrigatório e acompanhamento legal.
Como um insano mental comprou uma arma para tentar assassinar o presidente dos Estados Unidos? Ora, facilmente.
Eu poderia listar aqui os massacres em escolas e clubes noturnos, lá nos Estados Unidos e aqui no Brasil, para refrescar sua memória e alertá-lo para o perigo de se permitir porte de arma.
Mas este artigo não é somente sobre isso. É sobre a ascensão do fascismo que precisa, para se consolidar, da livre posse de armas.
O fascismo precede o desejo de portar armas e esta posse é a manifestação, na prática, do desejo de eliminar os diferentes. Para isso os fascistas enrustidos desejam a posse de armas: para eliminar os “diferentes”. O fascista odeia os diferentes.
Falei em diferentes e veio à minha atenção um fato incontestável: os machistas e os fascistas estão saindo dos esgotos onde viviam, candidato e seus eleitores, e promovem a liberação do porte de arma. São todos favoráveis, por que será?.
No ataque realizado a Reagan, seu secretário de imprensa, James Brady, foi ferido na cabeça, tornando-se deficiente sem recuperação. Ele continuou como secretário de imprensa do Governo Reagan por um tempo, em um papel basicamente protocolar.
Brady, que no passado tinha o apelido de urso, e sua mulher Sarah Brady, tornaram-se ativistas pelo controle de armas e outras ações para reduzir a violência armada nos Estados Unidos. Como podemos observar pelas ocorrências de massacres que tornaram rotineiros nos Estados Unidos, fracassaram.
Espero que os senhores deputados e senadores não levem adiante as tentativas de revogar o Estatuto do Desarmamento e de liberação do porte de arma no Brasil. Espero, também, que os brasileiros não elejam o candidato apoiado pelos fascistas.
E espero, com toda sinceridade, que não tenhamos que contabilizar arrependidos após terem sido incapacitados, como James Brady. Ou assassinados, como John Lennon.
Infelizmente, o arrependimento veio tarde para Brady e, embora o trabalho de sua organização sem fins lucrativos Handgun Control, Inc. (mais tarde chamada de Brady Campaign To Prevent Gun Violence) mereça elogios, a verdade é que as ações do rico e poderoso lobby norte-americano a favor da livre produção e venda de armas são muito mais efetivas. Elegem presidentes da República, como foi o caso de Reagan e, recentemente, Trump, ou impedem o sucesso de candidatos que se posicionam contra a posse de armas.
Eu residi, trabalhei e estudei nos Estados Unidos no período de fevereiro de 1979 até dezembro de 1981. Acompanhei de perto, com interesse e horror, o crescimento do fascismo à americana, com a ascensão de Reagan. O pano de fundo, a desculpa para o crescimento da extrema direita, foi a invasão da embaixada norte-americana e o sequestro dos diplomatas e funcionários norte-americanos pelo Irã.
Quando me preparo para finalizar este artigo, dou de cara com uma notícia na TV informando que foram registrados no Brasil, em 2016, 929 casos de feminicídio e em 2017, 1133 casos, um aumento de 22% em um ano. Matéria no Estadão de 12/10/2018 – 18h12 – informa:
“Em 3 dias, cinco mulheres são vítimas de feminicídio no interior no interior de SP. Todas foram mortas com arma de fogo – entre elas, uma adolescente de 13 anos”.
A campanha do candidato do fascismo, do machismo, da homofobia e da agressão ao meio ambiente quer fazer-nos acreditar que com a liberação de armas haverá mais proteção para as mulheres.
Vocês já viram mulheres sairem em marcha nas ruas, lá fora ou aqui, pedindo liberação irrestrita do porte de armas?
Claro que não. Mesmo intuitivamente é fácil perceber quem irá armar-se, não só para se defender mas, principalmente, para agredir. Serão os homens adeptos da violência, agressores e nunca as mulheres, normalmente muito mais pacíficas. A conclusão é um exercício de simples lógica: as mulheres vão ser assassinadas com maior facilidade. Veja, abaixo, uma lúcida entrevista de Ciro Gomes, contra a loucura de se eleger um fascista para a presidência do Brasil.